Anvisa libera venda de produtos à base de
Até os anos 30, maconha era vendida nas farmacias para uma infinidade de doenças como asma e cansaço, era conhecido como cigarro de índio, foi banida das farmácias em 1938 e depois de 82 anos, ela voltará as farmácias de novo.
Cannabis no Brasil
Entenda o que muda com a
decisão e esclareça suas dúvidas a respeito da questão
Recentemente, a Agência Nacional de
Vigilância Sanitária (ANVISA) aprovou a venda de produtos à base
da planta Cannabis para uso exclusivamente terapêutico no
Brasil. A decisão, que passa a valer daqui a 90 dias e com validade de três
anos, foi considerada um avanço por importantes setores da área médica e legal.
Mas não deixou de levantar discussões e muitas dúvidas a respeito. Consultamos
dois especialistas para entender melhor sobre o uso desses produtos.
Confira:
Como era antes
Até o começo de dezembro de
2019, apenas a importação de produtos à base de Cannabis (para uso
terapêutico) era permitida. Contudo, para uma pessoa ter acesso a um tratamento
com o extrato ou óleo, era preciso um longo processo burocrático. “Primeiro, o
paciente precisava passar por uma consulta médica e sair de lá com três documentos: uma
receita, um laudo indicando que aquele seria o melhor tratamento para ele e um
termo de responsabilidade assinado”, explica Gabriel Barbosa, analista de
Desenvolvimento Regulatório e Projetos Científicos da HempMes Brasil. A
empresa foi a primeira a importar um produto à base de Cannabis com
autorização da justiça, em 2014.
E não parava por aí. Depois
disso, o paciente ainda tinha que fazer um cadastro e entrar com um pedido de
liberação na ANVISA. Esta, por sua vez, escalava um corpo técnico, que era
encarregado de analisar caso a caso. “Acontece que são tantos os pedidos que o
procedimento levava mais de dois meses. Sem contar o tempo de importação do
item, que durava cerca de duas semanas porque não podíamos ter um estoque aqui
no país”, conta o especialista.
E agora?
A partir da resolução da
ANVISA, produtos à base de Cannabis para fins terapêuticos poderão ser vendidos
em farmácias e drogarias do Brasil (as comuns, e não de manipulação). Eles
serão encontrados no uso oral ou nasal, e em forma de comprimidos, líquidos ou soluções oleosas. E poderão
ser receitados para o tratamento de 60 patologias diferentes.
O acesso a eles continuará
sendo controlado e, apesar de não terem sido classificados pela Agência como
medicamentos, eles seguirão as mesmas normas dos remédios que necessitam de
receitas do tipo A e B, dependendo da concentração de canabinoides existentes
neles. “Ou seja, ainda será necessária a receita médica e um termo de
consentimento para a compra do produto. Mas a grande vantagem é que, com eles
registrados e comercializados aqui, a pessoa sai da consulta, passa na farmácia e já pode iniciar o tratamento”, diz
Gabriel.
Além disso, o custo deve
diminuir bastante. “A estimativa é que haja uma redução de até 75% do preço do
produto. Um grande avanço para as famílias que não têm condições de arcar com
as despesas”, explica Viviane Torres, advogada que dirige o Torres & Torres
Sociedade de Advogados. “Outro fator que poderia melhorar o preço seria ter
o plantio liberado aqui no país, mas ele não foi”, complementa Gabriel.
Apesar de variar muito, os
gastos para manter um tratamento como esses vão de R$500,00 até R$ 4 mil por
mês. E vale lembrar que o uso recreativo da planta era e continuará sendo
proibido.
Efeitos no organismo
Os produtos à base de Cannabis para
uso terapêutico ainda geram muito preconceito. Afinal, a mesma planta também
pode ser usada para fins que envolvem questões muito mais polêmicas. Contudo,
para a ciência, já foi comprovado que ela possui diversas substâncias,
denominadas canabinoides, que podem trazer benefícios para o tratamento de
certas doenças. É o caso do CBD (canabidiol) e THC (tetra-hidrocanabidiol), os
mais estudados atualmente e que irão compor os óleos e comprimidos vendidos no
Brasil. Mas qual a diferença entre eles?
“O THC é o responsável por
provocar o famoso ‘barato’ no organismo – alterações no comportamento que
também podem trazer vantagens medicinais”, explica Gabriel. Já o CBD não causa
esse efeito, sendo mais usado para fins terapêuticos.
Ainda de acordo com ele,
diversos sintomas podem ser diminuídos pelas duas substâncias. Ele deu alguns
exemplos:
Epilepsia: “Há o
controle das crises. Pessoas que tinham de 80 a 100 convulsões na semana passam
a ter poucas no mês. Isso reflete diretamente no aprendizado e desenvolvimento
do paciente”;
Alzheimer: “Os
canabinoides são anti-inflamatórios e antioxidantes. E têm um efeito
neuro protetor, podendo aliviar os sintomas da doença ou até retardar o seu
avanço. O paciente percebe uma melhora na memória”;
Parkinson: “O principal
sintoma da doença de Parkinson é o tremor. E é justamente ele que é reduzido
com o uso dos canabinoides”.
Substância no esporte
Fala-se até nos benefícios
dos canabinoides para os atletas. Desde 2018, a Agência Mundial Anti-Doping
(Wada, em inglês), tirou o canabidiol da lista de substâncias que configuram
doping. Sabe por quê? “É muito comum atletas de alto rendimento sentirem dores musculares intensas após uma competição ou
treino. Mas eles não podem parar – têm que cumprir prazos e entregar mais
resultados. Muitos deles, para aliviar o desconforto, recorrem ao ibuprofeno.
Mas agora podem recorrer ao CBD, que traz menores efeitos colaterais, faz o
atleta dormir melhor e ajuda na recuperação”, diz Gabriel.
E as discussões continuam…
Por enquanto, os produtos
com as substâncias não serão fornecidos pelo Sistema
Único de Saúde (SUS). Para a advogada Viviane, esse é um avanço que ainda
está longe de acontecer, mas que deve ser discutido desde já. “Fiz parte de um
processo na justiça que lutou para conseguir um produto para uma criança cuja
família não tinha condições. Foi uma grande vitória, mas que demorou bastante e
teve várias fases e desdobramentos”, conta.